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Brian Eno & Jah Wobble – “Spinner”

Pop Rock

4 de Outubro de 1995
Álbuns poprock

AMBIENTES COM BARRIGA

BRIAN ENO & JAH WOBBLE
Spinner (7)

All Saints, distri. MVM


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Para evitar que lhe chamem molengão, Brian Eno lançou-se nos últimos tempos no empreendimento de afastar a imagem estafada do “papa do ambientalismo” que sobre ele se criou desde que em 1977 inventou e gravou o conceito da “discreet music”. Discos como “Nerve Net” ou a renovada colaboração com David Bowie, em “Outside”, apontam para esta reciclagem, sem, contudo, conseguirem fazer esquecer que é precisamente no território, ambíguo, da música ambiental que as suas características enquanto criador encontram melhor forma de expressão. Discos como “Music for Airports”, “On Land”, “Apollo Atmospheres”, “Thursday Afternoon” ou mesmo o radical “Neroli”, por muito que isto custe a engolir aos mais nervosos e impacientes, são obras importantes que vieram revolucionar alguns dogmas e ideias feitas sobre a composição e métodos de interpretação da música ocidental, ao mesmo tempo que diluíram por completo a separação entre as chamadas músicas “popular” e “erudita”. Isto para não falar na alteração dos processos auditivos, eles próprios forçados pela música de Eno a orientarem-se segundo novas coordenadas. “Spinner” vem alterar um pouco tais considerandos, na medida em que o papel de Eno, tantas vezes assumido, de catalisador e organizador de sons alheios (é inestimável a sua contribuição como produtor nas últimas duas décadas) dá aqui uma volta de 180 graus. Constituindo na origem material para a banda sonora do derradeiro e inacabado filme de Derek Jarman, “Glitterbug”, as fitas, gravadas “a sós, à noite e em casa” por Eno, acabaram, segundo este, por perder a sua relevância, uma vez separadas das imagens. Cortado o cordão umbilical, Eno optou então por se “entregar nas mãos de Jah”, como ele próprio diz. Opção bizarra que juntou o mestre da imponderabilidade ao musicalmente barrigudo e peso-pesado do baixo eléctrico Jah Wobble, um dos responsáveis pela invenção da “etno seca”. Em “Spinner” há faixas trabalhadas por Jah Wobble, outras por ele totalmente alteradas e massacradas e outras ainda em que a música original de Eno permaneceu intocável. Estas últimas são as mais interessantes do disco, pequenas pinturas ambientais/impressionistas ao bom estilo do ex-Roxy Music, com Wobble a tentar conter-se nas restantes, refreando a sua tendência para o pastelão, o que resulta engraçado em temas como “Like organza” e “Steam” (verdadeiramente energético e com um Justin Adams “frippiano” na guitarra); mas roça a “etno seca” em “Left where it fell” e “Unusual balance”, título apropriado para uma ligação contranatura; e descamba literalmente em “muzak” musculado de duvidosa utilidade em “Spinner”, pese embora a contribuição do baterista dos Can, Jaki Liebezeit. Foi o melhor que se conseguiu arranjar, dentro do conceito muito pessoal que Eno tem sobre o rock & roll.



Jah Wobble’s Solaris – “Live in Concert” (self conj.)

18.04.2003

Jah Wobble’s Solaris
Live in Concert

Jah Wobble
Fly

30Hertz, distri. Universal

6/10

LINK

Ostentando os números 18 e 19 da série hertziana, “Live in Concert” e “Fly” são os mais recentes desenvolvimentos de Jah Wobble, o paquiderme do baixo. “Live in Concert” reúne uma formação de luxo com o pianista Harold Budd, o baterista dos Can, Jaki Liebezeit, o trompetista com um pé no jazz e outro na “world”, Graham Haynes, e um sefundo baixista na pessoa do igualmente proboscídeo Bill Laswell. Apresentado como uma abordagem “holy minimalist” de “texturas jazz, world e dub” embaladas numa “paisagem modal”, “Live in Concert” varia entre a jam adrenalínica, o “dub” pneumático de baixas frequências e próteses rítmicas enxertadas a partir do material genético dos Can, com os dois baixos e a “human drum machine” Jaki Kiebezeit a carburarem em tandem. Falta subtileza a estas divagações oleosas que deveriam homenagear a fábula metafísica saída da pena de Stanlislaw Lem. “Fly” compõe-se de 11 “voos” cuja tripulação integra Clive Bell, Harry Beckett e Jean-Pierre Rasle. De nada valem, porque logo à segunda descolagem a aeronave despenha-se contra as cordilheiras da “etnoseca” com selo Enigma. O resto é a dose habitual de “dub”, funk & house, um magnífico voo nº4 a fazer lembrar o “Requiem” que permanece até à data como a obra mais conseguida do ex-P.I.L. e uma sequela requentada da folk universalizante que Jean-Pierre Rasle ajudou a criar nos Cock & Bull. O melhor são as fotos da capa.

Jah Wobble – Requiem

03.10.1997
Jah Wobble
Requiem (7)
30 Hertz, import. Symbiose

LINK (Anthology – I Could Habe Been A Contender)

Jah Wobble não pára de nos surpreender, desta feita pela positiva. “Requiem” demonstra que o peso-pesado do baixo afinal é capaz de fazer mais que calcetar música com o seu martelo-pilão de baixas frequências. A primeira parte desta composição, inspirada na audição da música de Oliver Messiaen, é uma sequência circular para Synclavier e orquestra, com um motivo recorrente de vaga inspiração celta. A segunda, em forma de cantata, reforça a nota de tristeza própria de um requiem, evocando a grandiosidade coral de um Carl Orff.
Na terceira, em andamento ainda mais lento, um oboé introduz uma orquestração e contornos “micahel nymanianos”, derivando depois para um “andante” de percussões sintéticas contra vozes semiorientais, sequenciadas numa rítmica típica dos Magma. “The Father” e “The Mother”, os dois restantes temas, completam este “Requiem”, numa nota de religiosidade mariana. “O pai” inclui uma divagação de órgão de igreja virtual, enquanto “a mãe”, variação moderna de uma “Cantiga de Santa Maria2 de Afonso X, torna mais real e dramático o som do órgão de igreja, numa manifestação eloquente de devoção à Virgem Maria. Temos assim um Jah Wobble cada vez mais devoto. Quem diria… Ele que até já fez parte dos Public Image, ao lado de John Lydon, vulgo Johnny Rotten…