Shegundo Galarza – “Morreu Shegundo Galarza, Rei Da Música De Salão” (artigo de opinião / obituário)

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domingo, 05 Janeiro 2003

Morreu Shegundo Galarza, rei da música de salão

O piano de Shegundo Galarza deixou de tocar a música agradável que animou os serões televisivos dos anos 60. A música ligeira portuguesa ficou mais pobre


Shegundo Galarza gravou mais de 200 programas para a RTP e deixou gravados 52 LP


O maestro e pianista Segundo Ramón Galarza Araco faleceu ontem em Lisboa, aos 78 anos, vítima de doença prolongada. Galarza, basco, “nacionalista mas não separatista”, natural de Segura, na província de Guipúzoa, a cerca de 40 quilómetros de San Sebastian, ficou conhecido em Portugal como Shegundo Galarza por influência dos jornalistas portugueses.
Aos 18 anos conquistou o primeiro prémio do Concurso de Piano para a Juventude. Recebeu do antigo Presidente da República, Mário Soares, o Grau de Comendador da Ordem de Mérito. O seu filho, Ramon, já nascido em Portugal, é um dos nomes conhecidos da nova geração de músicos nacionais, não só como baterista mas também como produtor discográfico.
Admirador de Maria João Pires, Shegundo fez o Conservatório de Bilbau — piano, harmonia e composição — e dizia que a agilidade que tinha ficou a dever-se a “andar milhares de quilómetros e ter jogado muita pelota basca”. Gostava de se apresentar como um “basco de boa cepa” e, ao fim de cinco décadas de carreira em Portugal, nunca perdeu o sotaque de origem nem conseguia falar fluentemente português.
Tornou-se uma figura emblemática da chamada “música de salão”, hoje de novo na moda e eufemisticamente designada de “easy listening”. As notas do seu piano foram tão discretas como a sua vida, embora tivesse privado de perto com a sociedade portuguesa, em particular “as pessoas da alta elite”, as quais, dizia, “dançam muito mal”.
Classificava o público português de tímido e reservado e contava que quando se estreou em Portugal, no Natal de 1948, no Casino Estoril, a sua principal preocupação era saber se as pessoas tinham gostado ou não da sua música.
Tocou Cole Porter para os “senhores da noite” na Costa do Sol daquele tempo: o rei deposto Umberto de Itália, o ex-rei Carol da Roménia, o conde de Barcelona, o conde de Paris e o arquiduque da Áustria, entre outros. Durante algum tempo, foi professor da infanta Margarida de Espanha, irmã do rei Juan Carlos. Durante 20 anos, até 1975, tocou todas as noites no restaurante Mónaco.
Shegundo Galarza foi solista, maestro, arranjador, compositor, gravou mais de 200 programas para a RTP e deixou gravados 52 LP, em piano solo ou com acompanhamento de orquestra. Entre os seus trabalhos para televisões estrangeiras, destaca-se a sua participação nos espetáculos de Edmund Ross e Xavier Cugat.
Criou a banda sonora de algumas longas-metragens, entre as quais “Fado Maldito”, com Amália Rodrigues, e de centenas de documentários. Trabalhou com Max, Tony de Matos, Madalena Iglésias, Simone de Oliveira, João Maria Tudela, António Calvário, Lara Li e José Cid, entre outros.
Em 1981, acompanhou Carlos Paião (também já falecido) no Festival da Eurovisão em Dublin, como diretor de orquestra da canção “Play back”. Em 1996, Maria de Lurdes Carvalho organizou, com Cidália Meireles, uma compilação em que o pianista basco tocava “Lisboa Antiga” e “Aldeia da Roupa Branca”.
A sua primeira atuação na televisão portuguesa aconteceu no ano do seu aparecimento em Portugal, em 1957, quando tocou piano num programa de José Atalaya. Um outro programa, só seu, que teve na RTP chamava-se “Shegundo Galarza e os seus Violinos” e foi para o ar até 1966.
Dizia o maestro: “Durava 20, 25 minutos. Era só música, não tinha palavras, passava à hora de jantar. As pessoas estavam a jantar e a ouvir, era muito agradável.”



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