Brigada Victor Jara – “Tamborileiro” + Brigada Victor Jara – “Monte Formoso” + Vai De Roda – “Vai De Roda”

POP ROCK

15 Janeiro 1997
reedições

Depois da revolução

BRIGADA VICTOR JARA
Tamborileiro (8)
Monte Formoso (8)
Ed. Farol

VAI DE RODA
Vai de Roda (9)
Ed. Movieplay


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Três reedições históricas de dois dos grupos cuja obra influenciou mais fortemente os caminhos da música de raiz tradicional portuguesa nas duas últimas décadas. Exemplares também da maneira como quiseram e souberam ultrapassar a carga ideológica e os modos de produção artesanal (ambos animados das melhores intenções, mas que destruíram tanto como construíram…) que caracterizaram grande parte da safra da primeira (e, sem dúvida, mais revolucionária, pelo menos em matéria de entusiasmo partidário…) geração de músicos desta área.
Com a reedição em compacto de “Tamborileiro”, de 1979, e “Monte Formoso”, de 1989, a juntar ás já efectuadas, “Eito Fora”, também pela Farol, e “Contraluz”, pela Sony Music, falta apenas “Marcha dos Foliões” para a totalidade da discografia da Brigada ficar disponível no formato digital. Já com “Vai de Roda”, de 1983, fica completa a trilogia até agora gravada pelo grupo de Tentúgal, juntando-se a “Terreiro das Bruxas” e ao recente “Polas Ondas”.
“Tamborileiro” é um dos “clássicos” trabalhos do grupo, onde este lima as arestas do anterior “Eito Fora” sem desvirtuar em demasia as diversas componentes tradicionais, do jogo poderoso da percussões às linhas melódicas das vozes, das quais cabe destacar a de Né Ladeiras, em “Rema”, “Ó menino” e “Charamba”. Os arranjos dos tradicionais dos Açores (três), Beira Litoral, andavam ainda longe do arrojo e das experimentações que caracterizariam os futuros “Monte Formoso” e “Contraluz”, soando a sua pureza e concisão de forma cristalina.
“Monte Formoso” apresenta já as linhas de sofisticação que marcariam a evolução do grupo até à actualidade. Para tal, muito contribuíram a entrada para o grupo das cordas e das palhetas duplas de Aurélio Malva e do piano de Ricardo Dias, que vieram reforçar as “vozes” solistas de Manuel Rocha, no violino, e Rui Curto, no acordeão e concertina. A Brigada era, em 1989, um grupo “folk”, com todas as implicações, conotadas com “impurezas” e ousadias, inerentes ao termo. Os ritmos abandonam o peso telúrico dos bombos e percussões tradicionais, passando a ser comandados pela bateria e pelos compassos rock. Por outro lado, a delicadeza das vozes femininas foi substituída pela pujança de polifonias masculinas, como em “Tosquia”, um dos pontos mais fortes de “Monte Formoso”, ao lado de “Bento airoso”, este uma das melodias mais evocativas alguma vez “arrancadas” pela Brigada. Um disco sem medo de empregar o fraseado jazzístico de um piano ou de um saxofone, orgulhosamente equilibrado entre a herança rural e a pesquisa de fórmulas novas para a música portuguesa de raiz tradicional.
“Vai de Roda”, incluído na lista do Poprock dos “melhores álbuns de sempre” da música portuguesa, faz parte daquela época em que um dos objectivos principais dos grupos então existentes era, mais do que o da subversão, a preservação de uma herança cultural. É o álbum, em termos de impacte, de “apresentação” da sanfona aos ouvidos urbanos, mas também, mais importante do que isso, de aculturação da música tradicional a um conceito estético global que desenvolvia em simultâneo, a adaptação das técnicas de interpretação tradicionais, a recriação das formas musicais arcaicas e a criação de um tipo de sensibilidade (do músico/intérprete mas também do auditor) que sintetizava modos distintos de abordagem ao folclore: a fidelidade às origens e a elaboração de um universo mítico-simbólico (materializado sonoramente na utilização de sons naturais como os da chuva, foguetório, grilos ou do “demónio da floresta”, na criação de ambientes oníricos), que viria a desmultiplicar-se na sua máxima complexidade em “Polas Ondas”.



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