Genf – Import/Export (conj.)

29.05.1998
Electrónica
Válvulas De Escape

O disco que vai rebentar mais do que os ouvidos até mesmo com as colunas de som é “Import/Export”, dos Genf, uma orgia de baixas frequências, gravadas nos estúdios dos Can por René Tinner, que empurra a gravidade dos Ui para os patamares inferiores do Inferno. Não há “drum’n’bass” que resista a instintos tão baixos. Quando muito, “bas’n’bass”… (Compost, distri. Megamúsica, 7).

Mark Nelson é um dos elementos dos Labradford que no seu projecto a solo, Pan.American, se demarca da sua banda. “Pan.American” experimenta com subtileza o tecno ambiental e o “trip-hop”, numa base igualmente contemplativa, mas onde latejam sonoridades por vezes próximas dos Biosphere. (Kranky, distri. MVM, 7).

Para os lados do ambientalismo, sinónimo de paisagens inóspitas e de explorações de risco, os Visna Mehedi Ensemble propõem, em “Unintentional Beauty”, a visita a uma galeria de quadros abstractos pintados com a paleta étnica de Robert Musci (um dos elementos do “ensemble2), o cavalete conceptual de John Cage e o pincel acusmático de Jocelyn Robert ou de Steve Moore, com alçapões para o “hip-hop”. (Lowlands, distri. Ananana, 8).

Roberto Musci (será preciso lembrar o trabalho precioso que tem desenvolvido com Giovanni Venosta?) tem a partir de agora disponível o seu trabalho a solo, “The Loa of Music”, de 1983, percursor da obra-prima “Water Messages on Desert Sand”. Inspirado nas máscaras, nas invocações e nos rituais curativos vodu, o álbum, reintitulado “Debris of a Loa”, inclui um tema de homenagem a Harry Partch, fusões de samplers com detritos étnicos de proveniência suspeita e um disco inteiro de bónus, “Umi – The Sea”, gravado entre 1993 e 1997, de parceria com Claudio Gabbiani, guitarrista e manipulador de samplers e fitas magnéticas. (Lowlands, distri. Ananana, 8).

Os amantes da excentricidade têm a partir de agora acesso, embora pela porta de saída, a um dos primeiros discos distribuídos pela Recommended, “The Way Out”, de L. Voag. Voag é um maluco que junta o gosto pela anedota de Ivor Cutler, o ska andróide, a excentricidade electrónica de Ron Geesin, o prazer das construções mongolóides dos Renaldo & The Loaf e o parasitismo jazzístico de David Garland. Um “cocktail” de surpresas que não desagradará a quem se deliciou com a descoberta de Fuschimushi Math-Ice. A par de uma faixa de silêncio, para descansar, há ainda a inclusão do EP “Move”. (Alcohol, distri. Matéria Prima/Ananana, 8).

O rock alemão continua a estender os seus tentáculos. Quando saiu já o novo dos Kreidler, entram em cena os Schlammpeitziger, com “Spacerokkmountainrutschquartier”, uma colecção de referências e citações ao passado. Os Schlammpeitziger refazem a fábrica de brinquedos eléctricos de “Zuckerzeit”, dos Cluster, em temas que parecem ter sido compostos pela dupla germânica, como “Bienenkopfkoobgeflecht” e “Discoboingbeach” andam no carrossel mágico dos Harmonia, numa aproximação mais do que evidente, em “Hokytonkschlickummpittz”, e acompanham a corrida dos Neu!, no título-tema. Como passatempo, descubram onde se encontra escondida a fachada de “New Age of Earth”, de Ashra/Manuel Göttsching… Depois do reagrupamento dos genuínos krautrockers nos La! Neu? e nos Space Explosion, e das ressureições dos Faust e dos Amon Düül II, os Schlammpeitziger são portadores tardios do facho que conseguiram capturar a substância dos mestres e as formas arquetípicas dos anos 70. Não fica mal arrumá-los ao lado dos clássicos. (A-Musik, distri. Matéria Prima/Ananana, 8).

Os F.X. Randomiz, também alemães, logram em “Goflex” fazer a síntese da música programática elevada ao grau lógico mais elevado de uns Oval ou de uns Lan, com o mesmo tipo de humor tecnológico de Chris Burke (de “Idioglossia”9 e um swing eléctrónico que não se encontrava desde os primeiros Yello ou dos… Pyrolator. Se os Tone Rec advogam os prazeres do sado-masoquismo, através da chicotada, os F.X. randomiz cultivam o epicurismo da repetição e o fetichismo dos computadores. (A-Musik, distri. Matéria Prima/Ananana, 8).

Reedição de maior importância é a de “Outside the Dream Syndicate”, de Tony Conrad com três músicos dos Faust, Werner Diermeier, Jean-Hervé Peron e Rudolf Sosna, gravação de 1972, Tony Conrad, compositor e violinista, hoje recuperado pelas falanges do pós-rock, fez parte do “Teatro de Música Eterna” de La Monte Young, mas foi sempre personagem malquista entre os minimalistas. A sua posição, de um anti-academismo ferrenho, a par da rudeza de meios de que sempre deu mostras, chocava com as ambições do grupo. A reedição recente de uma caixa contendo a totalidade das suas composições minimalistas do princípio dos anos 60, voltou a repor algumas interrogações, reposicionando a obra deste americano no seio do movimento. O encontro de Conrad com os Faust, então uma autêntica erupção de novidade nos meios pop vanguardistas da Europa, processou-se por via do produtor e descobridor do grupo, Uwe Nettelbeck, constituindo uma das primeiras edições da editora Caroline, então subsidiária da Virgin. “Outside the Dream Syndicate” está para o minimalismo como “Metal Machine Music”, de Lou Reed, está para o rock. Para muitos a audição das duas faixas que fazem parte da versão original em vinilo, “From the side of man and womankind” e “From the side of the machine”, ra e continua a ser insuportável. São duas procissões intermináveis (26 minutos cada) de uma só nota e uma só batida (imagine-se “It´s a rainy day, sunshine girl”, dos Faust, pasado por um rolo compressor, que procuram desenvolver e transcender o conceito de monotonia, tomando como base notações matemáticas pitagóricas e o transe da música indiana, para chegar a uma inversão da “dream music” profetizada por La Monte Young. Aos dois temas originais, Tony Conrad acrescentou para esta reedição um terceiro, “From the woman and mankind”, como que a estabelecer uma simetria capaz de tornar o seu sonho num “loop” de tortura universal. E, no entanto, ficamospregados a esta medida que faz do nada o infinito. (Table of Elements, import. Virgin, 8).

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