Arquivo da Categoria: Críticas 2002

The Rolling Stones – “Their Satanic Majesties Request”

27.09.2002

The Rolling Stones
Their Satanic Majesties Request
ABKCO, distri. Universal
10/10

A Jóia dos Malditos

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“Their Satanic Majesties Request”, registo ímpar na discografia dos Stones dos anos 60, faz parte do pacote “the Rolling Stones Remastered”, composto por 19 álbuns (22, se considerarmos que “Out of our Heads”, “Afternath” e “Between the Buttons” sairão em dose dupla, correspondentes aos diferentes alinhamentos das edições inglesa e americana), que serão postos à venda a 21 de Outubro. Da embalagem em formato digipak a um processo de prensagem “dois em um” que reúne os registos super áudio CD e CD áudio normal, tudo foi pensado em termos de “edição definitiva”. Editado originalmente me 1967 com uma capa dom uma foto em 3D (na presente reedição substituída por um holograma), “Their Satanic Majesties Request” é o álbum psicadélico dos Stones. O disco maldito que poucos ousam incluir na sua lista de preferências mas sem dúvida aquele que mais longe levou o lado inexplorado do grupo e é digno de ombrear com os grandes clássicos do psicadelismo., como “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”, dos Beatles, “Odesse and Oracle”, dos The Zombies ou “Begin”, dos The Millenium. Muito do seu exotismo é fruto do impulso das drogas alucinogénicas que então integravam o “input” inspiracional da maioria dos grupos da época, matéria em que Brian Jones (falecido dois anos mais tarde, vítima de “overdose”) era especialista. Foi ele o primeiro feiticeiro a render-se a Lúcifer, dele recebendo os seus tesouros amaldiçoados, pelos quais pagou com a própria vida. Cravos, mellotrons, “sitars” indianos, ritmos africanos encantatórios, tudo encaixa como os fragmentos simétricos de um caleidoscópio, criando uma fantasmagoria suspensa no abismo da qual emerge uma das mais belas canções de sempre do grupo: “She’s a rainbow”, emblemática da “weirdness” psicadélica, como é Lucy, no céu com diamantes.
Em “Their Satanic Majesties Request” os Stones quiseram ser poetas e, como os Beatles, trazerem para a pop uma beleza sobrenatural. Conseguiram-no, roubando ao mais belo e terrível dos anjos a sua jóia dilecta: uma esmeralda. Brian Jones morreu. Mas suspeita-se que a pedra verde continue, oculta, a cintilar no coração de Mick Jagger.

Peter Hammill – “Unsung”

04.01.2002

Peter Hammill
Unsung
Fie, distri. Megamúsica
6/10

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“Unsung” insere-se numa série de álbuns instrumentais de Peter Hammill que inclui os anteriores “Loops and Reels” e “Sonix”, bem como “Spur of the Moment”, com Guy Evans, e “The Appointed Hour”, com Roger Eno. O poeta e músico explica que as peças nele incluídas insistiram em permanecer no formato instrumental, de acordo com uma vertente a que Hammill chama “experimental”, em oposição, ou complemento, à “normal”, constituída por canções. O que aqui encontramos são fragmentos organizados de “ambient music”, por vezes próximos das “frippertronics” de Robert Fripp, loops esculpidos por forma a soarem como música de câmara, ensaios de “contemporânea erudita” e pedaços de melodias polvilhadas pelo açucareiro dos Durutti Column. O que aqui não se encontra, porém, mesmo levando em conta a descontracção típica de um trabalho deste género, é o génio que raramente anda ausente na discografia “oficial” do ex-líder dos Van Der Graaf Generator. Ainda que mantendo níveis de qualidade e de exigência próprios do autor, “Unsung” denota por outro lado ter este privado talvez em demasia com Roger Eno…

Lúnasa – “The Merry Sisters of Fate”

03.05.2002

Lúnasa
The Merry Sisters of Fate
Green Linnet/Resistencia, distri. Sabotage
8/10

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pwd: folkyourself.blogspot.com

Sabe bem ouvir discos como “The Merry Sisters of Fate”. Fica-se com a cabeça a andar à roda e o coração em sobressalto, com uma sensação de frescura agarrada ao espírito e à pele, e uma vontade irresistível de agarrar na trouxa e passar o resto dos dias na Irlanda. Os Lúnasa ouviram e aprenderam do passado o que importa ouvir e aprender. Está cá tudo. O musgo, o bosque, o verde, o sol, a chuva, a vivacidade de uma música onde o sagrado, o profano e o virtuosismo dão as mãos. A agilidade com que os Lúnasa efectuam as tradicionais mudanças de ritmo, a conjugação – em contraponto ou em uníssono – das “uillean pipes” (Cillian Vallely é já um caso muito sério neste instrumento…), do violino e da flauta irlandesa, a riqueza e firmeza dos timbres, o balanço instrumental (o título-tema, um reel de fazer dançar Deus e o diabo, é a prova real deste parentesco), apontam na direcção dos Bothy Band, mas sem cair na cópia. Já perceberam: da melhor “Irish Folk” que temos ouvido nos últimos tempos.