Arquivo da Categoria: Críticas 2005

Kronos Quartet – Mugam Sayagi: Music of Franghiz Ali-Zadeh

11.02.2005
Kronos Quartet
Mugam Sayagi: Music of Franghiz Ali-Zadeh
Nonesuch, distri. Warner Music
8/10

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“Mugam Sayagi” é um dos trabalhos mais herméticos e de difícil captação do Kronos Quartet. Os próprios admitiram ter encontrado na música de Franghiz Ali-Zadeh territórios virgens para se movimentarem. Ali-Zadeh é um pianista do Arzebeijão cujos estudos assimilaram a música do seu país, da antiga URSS e das tradições da música árabe, a par de um conhecimento profundo das técnicas e da história da música ocidental do último século. Evitando o “folclorismo sinfónico” condenado por Schoenberg, Ali-Zadeh alia, contudo, pormenores de execução transpostos de instrumentos étnicos aos ensinamentos e prática que a levaram a incorporar-se na Segunda Escola de Viena, de Messiaen, Crumb e Cage. A pianista toca em dois dos quatro temas de “Mugam Sayagi”, sendo de particular interesse a interpretação a solo em “Music for Piano”. Uma música flutuante, misteriosa, aquática, esotérica como a de Satie. O elemento líquido está também presente em “Oasis”, onde é possível escutar gotas de água e murmúrios longínquos de vozes humanas. Os 20 minutos finais do título tema constituem a imersão absoluta do quarteto no universo da pianista, com os seus “pizzicatos” a elevarem-no da gravidade e do silêncio.

The Dead Texan – The Dead Texan

18.02.2005
The Dead Texan
The Dead Texan
Kranky, distri. Sabotage
6/10

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Brian Eno é quem tem culpa de ter inventado a música ambiental. Em seu nome, está justificada toda a música cujos efeitos são soporífero, analgésicos, anestesiantes ou qualquer outro estado de adormecimento ou embrutecimento mental. A sua “Discreet Music” abriu portas que até hoje ficaram emperradas. Adam Wiltzie, dos Stars of the Lid, é óbvio seguidor de Eno. Com uma ressalva, enquanto so Stars of the Lid levam a estética de uma “drone” só espremida até ao infinito, Wiltzie é mais esteta, como o Eno de “Another Green World”. “The Dead Texan” consegue ser interessante no modo como articula as premissas do ambientalismo (longas e calmas notas sobrepondo-se em camadas a notas ainda mais longas e calmas) com o desejo de canção e de um certo classicismo com selo Gavin Bryars. Mais como os Labradford fazem e os Biosphere faziam no início (“A chronicle of early failures”). As vozes são apagadas, afogando-se me lagos de jardins, os pianos e guitarras juntam cromos de paisagens do chão para com eles criarem vinhetas de sentido dúbio. A “ambient” de Adam Wiltzie está exposta em montras iluminadas e as suas personagens são bonecos animados de vida artificial. Estados febris.

Clive Palmer – All Roads Lead To Land

18.02.2005
Clive Palmer
All Roads Lead To Land
Communion, distri. Sabotage
5/10

Está deslocado, parece inacabado, tem uma tristeza que parece fado, ainda por cima o cantor não tem uma grande voz e toca banjo como se estivesse a martelar pregos. E, no entanto, “All Roads Lead to Land” destila timidamente um encanto especial. Clive Palmer foi nos anos 60 e 70 um segundo-divisionário da folk britânica. Fez parte da formação original dos Incredible String Band, que abandonou para se juntar aos Famous Jug Band e formar os C.O.B. (“Clive’s Own Band”), com os quais gravou dois belos e místicos álbuns, “Spirit of Love” e “Moyshe McStiff and the Tartan Lancers of the Scared Heart”. O presente registo é uma sessão de 1999, aumentada de dois temas, que traz a voz triste de Palmer, com as suas liturgias intemporais e amores perdidos que se recordam ao cair do Outono. É uma espécie de émulo, mais grave e monocórdico, de Robin Williamson, dos Incredible String Band, que participa como convidado, e em “Sands of Time” parece o vocalista dos Sétima Legião. Mais interessante é “Breizh”, lenga-lenga bretã em que Clive toca o bordão gaita-de-foles e canta “la la la” num tom razoavelmente céltico. Mas é um encanto que não perdura, como se o próprio Palmer há muito se tivesse esvaído nas sombras dos seus antigos sonhos.